segunda-feira, 21 de março de 2016

Com A Berta Ao Fim Da Tarde

Os mais atentos sabem que hoje é o Dia Mundial da Poesia. Para assinalar esse dia, decidi deixar aqui um poema de Ulisses Duarte, chamado Com a Berta ao Fim da Tarde. Este poema, inspirou-me há uns anos a escrever um texto em prosa que também partilho.
 
 
 
 
Com A Berta Ao Fim Da Tarde
 
« Quando tinha quinze anos,
três portas depois da minha,
morava a viúva Berta
que trinta, ainda, não tinha.
Era linda. Os seios dela
trepando pelo corpete
par'ciam vir à janela
dum castelo de colchetes.
Um dia, pela tardinha,
passando à porta da Berta,
vi a porta entreaberta
e a Berta, aos sinais, sozinha.
Se pensei por um segundo
mandei o segundo à fava...
Havia, ali, outro mundo
na Berta que me esperava.
Mal entrei, fechou a porta
e logo, num desafio:
- Vou-te contar um segredo
porque só em ti confio.
Então, olhou-me de frente,
pôs as mãos no meu pescoço
e disse em tom d'alvoroço:
- Vem pr'aqui que está mais quente!
Devagar... devagarinho...
enquanto me desnudava
me vestia de carinho
com o prazer que me dava.
Então, tirei-lhe o corpete...
E a roupa que ela vestia
ficou, ali, no tapete
à espera do outro dia.
Meus lábios eram de fogo,
os dela eram de chama...
Quando o incêndio chega ao corpo,
só pode acalmar na cama...
A minha boca na dela;
a dela na minha boca...
Toda a ternura é mais bela
quando, sem saber, se troca.
Logo após um amplexo
que nunca mais me esqueceu,
ela agarrou no meu sexo
e pô-lo às portas do seu.
Alimentando o sentido
duma nova descoberta,
A Berta dizia: - Querido!...
Penetra, filho... penetra!
Penetra,... filho... penetra...
Pe... ne... tra..., fi... lho, pe... ne... tra...
»

Ulisses Duarte

 
Há uma ansiedade a crescer em mim, uma leve angústia apodera-se do meu ser. Esta espera, as horas que não passam. O barulho do relógio, no silêncio da noite, o único som que oiço para além do bater do meu coração. Todos os dias, sempre a esta hora, espero. À hora que todos dormem. Já é quase meia noite e tu ainda não chegaste...
Tudo começou no outro dia, em que vinhas da escola. És meu vizinho, tens quinze ou dezasseis anos, creio eu. Tu olhavas sempre, cada vez que passavas e dizias: Boa Tarde, D. Berta, com aquela voz que ainda não é de homem, mas já não é de criança, própria dos adolescentes, nessa fase que mudam a voz. Cada vez que tu passavas, eu sentia um estranho desejo de te falar e de sentir os teus lábios nos meus.
Um dia, decidi arriscar e convidei-te a entrar, vi o desejo no teu olhar, mal o fizeste fechei a porta, não esperei muito; disse-te que ia contar-te um segredo, pus as minhas mãos no teu pescoço...
Um fogo apoderou-se de nós, as minhas mãos no teu corpo, as tuas despiam-me o corpete, a saia. As tuas mãos, que ainda não são fortes como as dos homens, eram desajeitadas e inexperientes. As nossas bocas unidas e o fogo continuava a consumir-nos.
Deitada na minha cama recordo esse momento, em que as mãos e as bocas se procuravam num desespero que parecia não ter fim.
Não posso continuar esta loucura, todos os dias decido que é a última vez que isto acontece, que é a última vez que nós fazemos amor.
Sabes porque é uma loucura? Porque tu ainda és um rapaz, que ainda anda de calções e não tem barba para desfazer. Mas mesmo assim eu quero-te!
Esta paixão, este desejo que arde cá dentro durante o dia, apenas pode ser aplacado pelas tuas mãos, pelos teus beijos. Se nos descobrem, nem quero pensar no que irão dizer ou fazer, ninguém sabe ou desconfia, pergunto-me: até quando? Os segredos têm vida curta.
Acho que as pessoas já desconfiam e olham-me de uma maneira estranha, ou serei eu que me sinto culpada? Sou viúva, há tão pouco tempo, sei que devo respeito ao meu falecido marido, mas ele esta morto e eu viva, consumida pelo fogo da paixão! Será errado já ter outro homem na minha cama? A tua mãe, já mal me dá os bons-dias. Às vezes, convidava-me para ir lá a casa, tomar chá, mas agora quase desde a altura que começaram estes nossos encontros que deixou de o fazer...
Continuo à espera que tu venhas, continuo a querer o teu corpo junto do meu. Começou a chover, esta chuva lavará a poeira que se tem acumulado nas casas e nos passeios, porém não irá a acalmar o fogo que arde em mim, só tu o podes fazer.
Ouço um leve bater na porta, abro-a, és tu. Não te deixo falar, beijo-te, estás todo molhado, tens de tirar a roupa...
Algumas horas passam, tu vais embora e eu fico só a pensar nisto tudo.
Eu não posso viver assim, nesta angústia. Eu não quero me separar de ti, e sei que não posso viver sem ti, que hei-de eu fazer?
 
    
 
 
 
 
 

 

    

 

 

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