segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Sobre filmes de época

Como já devem ter percebido pela leitura deste blogue, sou uma fã assumida de filmes ou séries de época. Hoje partilho com vocês algo muito verdadeiro dito por Tom Hooper, o realizador do filme The King's Speech. Hooper respondeu a algumas questões colocadas por leitores do jornal "The Guardian". Uma das perguntas foi:
How frustrating is it to see your work attacked by so many who seem unable to go beyond surface appearances, insisting on pigeonholing expressions such as "costume" or "period drama", as if they somehow diminished its value? How does an artist - for such is the filmmaker - try to overcome the formidable obstacle presented by this petty narrowmindedness, this unwillingness to engage or make any mental or emotional effort?

Tom Hooper respondeu:

It is very frustrating when it happens. I worry that the phrase "costume drama" has a sexist origin - used by male critics as a perjorative term about screen adaptations of mainly female writers : George Elliot, Jane Austen, Charlotte Bronte. To charge Austen or Elliot as being writers concerned only with the surface - what people are wearing - seems an extraordinary injustice to visionaries of our inner life. It also seems to diminish anything that is set before now, and it would appear to me to be an arrogance of the present to assume that anything set in the past is by default less interesting or more surface than the present.

O que ele diz só prova o quanto as escritoras mencionadas do século XIX são tão injustamente conotadas com literatura cor de rosa, livros para o mulherio e outras coisas simpáticas. Curioso como a sociedade incorpora as ideias feitas na mente e não tenta ver/ler e julgar por eles mesmos. E mais as estórias passadas no passado podem ter muita atualidade e verdade sobre a condição humana, sobre sentimentos, sobre a sociedade, o mundo em geral....


5 comentários:

Anônimo disse...

O problema fundamental desse tipo de literatura na minha opinião um pouco generalizada (vim a saber de duas dessas escritores no Wikipedia) é pelo facto de elas se cingirem praticamente ao universo feminino ou melhor tudo visto por apenas um ângulo, o que talvez fosse visto como escrita "menor" especialmente no século XIX onde quem escrevia sobre ciência e ou filosofia ficaria imoralizado, enquanto e já desde o Renascimento literário haviam escritores e outros artistas que pontualmente usavam mulheres como figuras principais da sua obra, o que não acontecia com frequência no caso destas escritoras e de outras bem mais contemporâneas, com excepção talvez da Agatha Christie, mas creio que nunca foram consideradas escritoras menores por falarem em universos mais restritos.

Por último, a pior razão. Quem fazia critica literária no século XIX? Haveria alguma mulher? Talvez não e isso também ajuda á "pejoração" mas o mais triste é que em pleno século XXI isto ainda ser notícia, portanto o tempo avançou mas a critica não.

Noutra perspectiva faz-me lembrar os filmes dos negros nos anos 70 e 80 como sinal da sua liberdade. Se reparares em certas obras do Spike Lee e outros, há filmes em que só entram pretos, algo que até aos anos 60 era motivo de troça, ou então fazia-se por não haver divulgação) e em que nos filmes "mainstream" eles sempre apareceram nem que fossem como personagens secundárias.

Tal como no cinema, o que aconteceu com essa literatura foi algo semelhante. Um processo de emancipação.
Just my opinion.

Eu não gosto de filmes de época, com duas excepções "O paciente Ingles" passado na II Guerra Mundial e "Cold Mountain" passado durante a guerra civil americana também devido à Natalie Portman que merecia ter sido a atriz principal ali.

Parece que o meu comentário ficou maior que o post. Desculpa lá :)

Anônimo disse...

Se ficou escrito "imoralizado", quis dizer "imortalizado". Uma letrinha com um oceano de diferença...

Madrigal disse...

Martini, dizes tanto que nem sei por onde começar a minha resposta.
É certo que os temas serão mais femininos, mas estas mulheres viviam confinadas ao seu lar, daí que escrevessem sobre aquilo que conheciam e viam, mas como tu dizes e bem não são consideradas menores por isso.

O problema é que alguns críticos atuais continuam a atirar pedras e a desdenhar, ainda não há mt tempo se falava disso lá no Jane Austen. Como tu dizes o tempo avançou mas a crítica não e esse é o problema principal.
Não sei se já leste a Madame Bovary do Flaubert, mas se não o fizeste eu digo-te que sendo um livro escrito por um homem e falando da frustração que uma mulher encontra após o casamento e sendo um tema ainda atual, nunca vi ninguém dizer que era um tema ou universo feminino, etc e por isso não valia a pena. Aliás, acho que o livro reflete e bem a desilusão de alguém que casou iludido com o outro, no sentido de achar que era uma coisa e sair-lhe outra.
Não haveria crítica feita por mulheres no século XIX, embora esteja a conjecturar.
Eu não conheço o Spike Lee, é a minha vez de dizer: estás a falar de coisas que não conheço. :)
Mas já vi o Could Montain que não me impressionou mt, mas adorei o Paciente Inglês.
Não precisas de pedir desculpa por escreveres mt. :) Gostei de ler o teu comentário. :)

Anônimo disse...

Nunca li Madame Bovary e imagina que até tenho esse livro em casa. Vergonha! :) mas é certo que agora deste-me uma motivação extra para o fazer.

Há dias falavas na obra do Mark Twain que está agora a ser "redesenhada" porque a sociedade de hoje já não aceita certos conceitos e opiniões dele, esquecendo que naquela época aquilo era assim mesmo, e faço um paralelo com isto, então porque a critica a esse tipo de literatura que falavas não muda, visto que naquela altura as coisas eram vividas daquela maneira?! É quase a mesma coisa, mas o termo "raça" fere mais que o termo "género" daí um Twain reinventado e essas escritoras segregadas, das quais também incluo a Enid Blyton, criadora de personagens e muito importante na literatura dos adolescentes que "formou" gerações de adultos durante décadas e completamente subvalorizada pela crítica e pelo mercado.

Aproveito para mais uma achega à questão que pode ter algum paralelo. Já deves ter ouvido falar no Goethe. Adoro o seu "Fausto" e especialmente a obra "Werther" uma obra-prima, muito coexistial para mim.
Esse livro escrito no século XVIII imortalizou esse escritor e filósofo alemão, mas a história em si não é estranha às da Jane Austen, a diferença é a intensidade e a profundidade do sentimento que ele consegue dar ao jovem Werther, com o seu vocabulário tão refinado e isto leva-me a dizer que se fosse a Jane Austen ou outra a escrevê-lo seria pejorado, mas como foi o Goethe a escrever sobre o suicidio do jovem devido a um amor não correspondido é aclamado e referencia da literatura e filosofia mundial (é o "pai" do existencialismo). Na altura houve imensos suicídios na Europa por causa dessa obra, considerada a primeira obra romântica (período literário) de certa forma equiparada à angústia do Romeu de Shakespeare, agora se fosse sobre a morte de uma mulher por um amor não correspondido seria um "drama familiar" como o tal critico inglês fala, agora sendo um homem é um "drama universal".

Era a literatura que havia e que de certa forma ainda continua, se reparares quantas mulheres ganharam um nobel da literatura? Talvez nem dez.. e isto diz muito...

PS: E vivam os posts interessantes :)

Madrigal disse...

começando pelo fim, se a memória não me falha qd a Elfriede Jelinek ganhou o Nobel disse qq coisa como: se fosse o *** ( não me recordo do nome) ganhava por mérito mas como é uma mulher fala-se mais nesse aspeto.
não consigo encontrar a afirmação.
Mas de qualquer modo dá-se mt enfase qd é uma mulher. Quando a Dilma Rousseff ganhou, lá vieram artigos no jornal a falar de outros países onde tb mulheres estavam no poder. Enfim, faz-se sp um estardalhaço para nada.
Qt ao resto concordo, já ouvi falar de Goethe mas ainda não li, mas irei fazê-lo, agora fiquei mais curiosa.
Se quiseres um parelelo, mais um! em português e que me lembrei de tarde: Almeida Garrett e Floberla Espanca, ambos escreveram belos poemas de amor, mas parece-me que só a Florbela leva tb às vezes o cognome de lamechas. :)
Um pequeno aviso sobre a Madame Bovary: o livro tem mais ação psicologica, tem poucos desenvolvimentos. Alguns comentários que li diziam ser um aborrecido, mas eu não achei, ainda hei-de ver se o releio.
E não tenhas vergonha, tenho imensos livros que já devia ter lido e ainda não o fiz. o tempo não dá para tudo.